Imagem criada com IA No meio de uma tarde abafada, a terra ressecada parecia clamar por água. O céu, em sua inquietação, ameaçava, mas não cumpria. As nuvens passavam rápido, deixando apenas promessas de chuva que nunca chegavam. Enquanto a cidade fervia, na sombra de uma mangueira centenária, dona Aurora, uma anciã de cabelos prateados e pele marcada pelo sol e pelo tempo, observava o cenário com uma serenidade que só os anos trazem. Ela, como muitas outras pessoas idosas de sua geração, carregava uma sabedoria quase extinta, forjada nas mãos calejadas que aprenderam a ler os sinais da natureza. Sabia quando a chuva viria pela dança das formigas, quando a seca se prolongaria pelo formato das nuvens, e quando o vento mudaria de direção pela simples sensação no ar. Para ela, o clima não era um inimigo imprevisível, mas um velho conhecido, com quem sempre soube negociar. Diante da crise climática que assola o mundo, marcada por e...
Dona Celina era a dona da padaria mais movimentada do bairro. Já passara dos setenta, mas a idade não domara nem um pouco sua energia e alegria. De salto firme e riso fácil, ela tinha um orgulho em acordar cedo, abrir as portas do estabelecimento e atender seus clientes com aquele sorriso que sempre dizia: "Hoje o dia é nosso." As vizinhas do bairro, aquelas das rodas de conversa e do olhar torto, sempre comentavam — como que sem querer, mas com todo veneno de uma serpente — que Dona Celina era “muito avançada pra idade dela”. Elas se incomodavam com o jeito de Celina viver a sua velhice. Algumas delas sempre falavam: “Imagina, Celina ainda usa biquíni!”. E não era um biquíni qualquer: era o VERMELHO, chamativo e ousado, que ela usava para pegar um solzinho no quintal, sem a menor vergonha. Dona Celina, como sempre, deixava as fofocas de lado e vivia sua rotina sem perder a pose. Mas, um dia, decidiu que era hora de...
Dona Célia tinha 90 anos e os olhos cansados de quem já viu o mundo mudar demais. Sentava-se todas as tardes na cadeira de balanço, no mesmo ponto da varanda, de onde podia observar o céu, como se quisesse decifrar o movimento das nuvens. A brisa leve que atravessava o jardim parecia um convite para pensar nos amigos, irmãos, e até nos vizinhos que foram partindo ao longo dos anos. Aos poucos, sem que percebesse, estava cercada por uma solidão irremediável, daquelas que se acomodam entre as rugas, nos pequenos vazios deixados pelos que foram embora. Ela não teve filhos, por escolha, dizem alguns. Mas a verdade é que as escolhas nem sempre pertencem a nós. “O mundo era tão grande, as possibilidades também”, dizia ela aos 30, cheia de planos que se diluíram ao longo da vida. O tempo, que parecia eterno, havia se transformado num acúmulo de despedidas. Seus amigos, um a um, partiram, deixando cartas, lembranças e uma sensação de que o passado lhe pertencia mais que o presente. Com o passa...
Comentários
Postar um comentário