Dona Célia tinha 90 anos e os olhos cansados de quem já viu o mundo mudar demais. Sentava-se todas as tardes na cadeira de balanço, no mesmo ponto da varanda, de onde podia observar o céu, como se quisesse decifrar o movimento das nuvens. A brisa leve que atravessava o jardim parecia um convite para pensar nos amigos, irmãos, e até nos vizinhos que foram partindo ao longo dos anos. Aos poucos, sem que percebesse, estava cercada por uma solidão irremediável, daquelas que se acomodam entre as rugas, nos pequenos vazios deixados pelos que foram embora. Ela não teve filhos, por escolha, dizem alguns. Mas a verdade é que as escolhas nem sempre pertencem a nós. “O mundo era tão grande, as possibilidades também”, dizia ela aos 30, cheia de planos que se diluíram ao longo da vida. O tempo, que parecia eterno, havia se transformado num acúmulo de despedidas. Seus amigos, um a um, partiram, deixando cartas, lembranças e uma sensação de que o passado lhe pertencia mais que o presente. Com o passa...
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