O Natal da Vila dos Girassóis

  

Na Vila dos Girassóis, um lar para pessoas idosas cercado de flores e histórias, o Natal tinha um charme especial. Lá, os dias eram iluminados por risos, lembranças e os raios dourados de um sol que parecia sempre brilhar um pouco mais forte.

    Dona Cora, a mais antiga moradora, estava agitada naquela manhã de dezembro. Aos 84 anos, comandava a organização da ceia com a autoridade de uma matriarca:

    - Natal sem bolo de frutas não é Natal! - dizia, com as mãos na cintura e os óculos escorregando pelo nariz. 

    Ao seu lado, Seu Benedito, que já tinha completado 90, fazia caretas enquanto descascava castanhas:

    - A senhora reclama mais que o rádio quando está fora da estação!!!! - provocava ele, com um sorriso escondido no bigode branco.

    Dona Cora não dava atenção. Estava ocupada demais decidindo se o presépio ficaria ao lado da árvore ou na entrada da sala:

    - As pessoas precisam lembrar que Natal não é só presente! - exclamava, enquanto ajeitava o menino Jesus no berço de palha.

    No pátio, Dona Zilda e Seu Anísio ensaiavam uma apresentação musical. Ela, com sua voz rouca, cantava clássicos natalinos acompanhada pela sanfona de Anísio, que já não tinha mais todos os dentes, mas mantinha o sorriso de menino levado. 

- Zilda, me acompanha, mas não desafina! - brincava ele, arrancando risadas da plateia improvisada de moradores e cuidadores.

    Quando a noite chegou, a Vila parecia mágica. As luzes piscaram na árvore improvisada, feita de galhos secos pintados de dourado, e os moradores se reuniram em torno de uma grande mesa decorada com toalhas vermelhas e fitas verdes. Cada prato tinha sido preparado com cuidado, cada detalhe pensado para tornar aquela noite inesquecível.

    Dona Cora fez questão de iniciar a ceia com um discurso: 

    - Estamos aqui, juntos, porque o Natal é isso: união, alegria e gratidão. E enquanto tivermos um ao outro, sempre haverá Natal na Vila dos Girassóis!

    As palavras simples emocionaram a todos. E, enquanto as taças de suco de uva eram erguidas e os brindes ecoavam, parecia que o tempo parava. Naquele instante, não havia idade, não havia saudades nem ausências. Só existia o presente, brilhando com a intensidade de um girassol sob o sol de verão.

    E assim, o Natal da Vila dos Girassóis se tornou mais um capítulo de ternura na história daqueles que, mesmo com os anos gravados no rosto, mantinham a alma vibrante e cheia de esperança.


Por Jôh Vieira

*Todos os direitos autorais reservados à autora.

*Créditos da imagem: Pinterest

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Crônica: A sabedoria que nasce do tempo

Velha demais para usar biquíni

O último pôr do sol